“OMBUDSMAN” É UM OUVIDOR, OU DEFENSOR DO POVO OU MEDIADOR.

Escandinávia

 A palavra ombudsman é de origem nórdica (região da Escandinávia) e significa “representante com missão pública”. Esse cargo surge na história da Suécia, ainda no século 16. Todavia, foi criado constitucionalmente naquele país no século 19, quando se consagrou o direito de petição, em que se reconhecia aos cidadãos o direito de reclamar contra atos de funcionários do rei, entre eles os juízes. Em essência, um ombudsman tem a responsabilidade de, em nome dos cidadãos, controlar os atos da administração pública objetivando combater o eventual abuso de poder por parte dos funcionários públicos. Ao final de cada ano ele deverá fazer um relatório de seus trabalhos e apresentar ao Parlamento.

 Resumindo, e em outras palavras, a função de um ombudsman consiste em defender a legalidade e o respeito aos direitos fundamentais dos cidadãos perante a burocracia estatal. É eleito pelos parlamentares, porém não está subordinado ao Parlamento e nem ao Governo. Tem tempo certo de mandato e poderá ser reeleito. O que o distingue é sua total independência – não tem vínculo com qualquer instituição – e seu notável saber jurídico. É importante que a pessoa escolhida para exercer essa função, além de ostentar ótima reputação social, esteja distante da política-partidária e que exerça a função com  imparcialidade.

 No século 20 essa idéia foi adotada com algumas alterações e adaptações à cultura local, pela Finlândia, depois pela Noruega e também pela Dinamarca. Pouco tempo depois, inúmeros outros países implantaram a figura do ombudsman. Até que um dia essa idéia evoluiu e surgiu o ombudsman setorial: da área militar, do consumidor, do meio ambiente, da liberdade econômica, da imprensa, da saúde etc. Há, também, países que criaram ombudsman estadual ou municipal.

 E, hoje em dia e no mundo todo, até mesmo as empresas privadas costumam ter seu ombudsman. Todavia, neste último caso, já com a corrosão da idéia inicial que impede o ombudsman de ter vínculos com instituições. Na iniciativa privada o ombudsman é um prestador de serviços e/ou colaborador com contrato assinado por empresários, ou seja, é uma pessoa de confiança da empresa que recebe a incumbência de atender a clientela, ouvir suas críticas e reclamações, bem como dar soluções aos problemas apresentados. O ideal é que um ombudsman não pertença aos quadros de funcionários da corporação.

 Os variados países escolheram diferentes nomes para a mesma função de ombudsman: em Portugal, chama-se Provedor de Justiça, na França chama-se Mediador, na Espanha Defensor do Povo etc. Em cada país suas incumbências e vínculos são diferentes. Aqui, no Brasil, já tivemos vários projetos para instituirmos entre nós a figura de um ombudsman nacional. Nos anos 80, no âmbito do Congresso Nacional, surgiram propostas de emendas constitucionais que visaram à criação de um Ouvidor-Geral ou Defensor do Povo.                                                           

 Todavia, com a reconquista do regime democrático e a partir da instalação da Assembléia Nacional Constituinte no mês de fevereiro de 1987, surgiram grandes debates a esse respeito. Havia, de um lado, parlamentares que defendiam a criação do Defensor do Povo e havia, de outro lado, parlamentares que achavam melhor dividir as atribuições de um futuro ombudsman nacional, atribuindo-as então, em parte ao Tribunal de Contas da União e outra parte para o Ministério Público. Venceu esta última proposição.

 Considerando-se que a extensão territorial do Brasil é enorme e, só por isso já enfrentaríamos sérios problemas na implantação operacional de um Defensor do Povo, penso que foi acertada a decisão dos parlamentares constituintes, pois já contávamos, por exemplo, com o Ministério Público em funcionamento em todos os estados da nossa federação. Ademais, o Ministério Público é uma instituição estatal autônoma e independente, requisitos básicos para o exercício de fiscalização da administração pública. Porém, até hoje há ilustres juristas brasileiros que ainda condenam os lobbies feitos à época pelos membros do Ministério Público e também do Tribunal de Contas da União, junto aos membros da Constituinte, visando conquistar as atribuições constitucionais previstas para um futuro Defensor do Povo.

No texto da atual Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada no mês de outubro de 1988, as atribuições anteriormente previstas para um ombudsman nacional, estão, portanto, repartidas entre o Tribunal de Contas da União e o Ministério Público brasileiro. Por exemplo, se você for ao artigo 129 da nossa Constituição, no qual se definem as funções institucionais do Ministério Público, verá que no inciso II está previsto que o MP deverá “zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia;” .

 Caso você não saiba, por exemplo, o que se considera serviço de relevância pública, bastará ir até o artigo 197 da Constituição e ler o seguinte: “São de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado.”

Portanto, o setor da saúde pública é considerado, constitucionalmente, de relevância pública e cabe ao Ministério Público, na qualidade de um verdadeiro ombudsman, ouvir as reclamações e críticas apresentadas pelos cidadãos – quando não forem bem atendidos nesse serviço público – cobrando eficiência das autoridades do setor e buscando as devidas soluções.

Penso que é preciso que toda população brasileira seja informada dessas histórias, para que cada cidadão possa formar sua opinião pessoal e, coletivamente, passe a exigir o cumprimento das regras contidas em nossa Constituição Federal, sabendo de antemão qual é o funcionário público incumbido de atender ao povo.

 Inês do Amaral Büschel, em 1º de fevereiro de 2011.